O artigo de hoje completa a trilogia sobre acessibilidade que comecei a escrever há algumas semanas. Primeiro falei sobre acessibilidade nas prateleiras do mercado (você pode ler aqui), depois nos rótulos das embalagens (disponível aqui), e neste artigo vamos falar sobre a acessibilidade nos produtos em si.
Por que os sachês de ketchup são tão difíceis de abrir?
A reflexão que eu trago hoje é sobre uma antiga, porém ainda muito atual (infelizmente), polêmica sobre a abertura dos sachês de condimentos.
Quando eu falo que sou designer de embalagem, uma das primeiras perguntas que recebo é: porque o sachê de ketchup não rasga onde deveria rasgar?
E eu fui atrás dessa resposta.
Como designer de embalagem – e não de produto, muitas vezes me sinto de mãos atadas para algumas ações, como, por exemplo, se o picote vai funcionar ou não no sachê de ketchup.
Sachês de condimentos nunca foram fáceis de abrir e certamente você já deve ter tido uma experiência negativa com esse tipo de produto. Em uma rápida busca pela internet me deparei com inúmeros relatos e vídeos tentando encontrar formas mais eficazes de abrir um simples sachê, como este vídeo que viralizou no Tik Tok ao ensinar um truque (sim, um truque) para abrir estas embalagens.
Pensando nesse assunto, em uma conversa sobre o Ciclo de Vida Útil de Produtos, questionei um professor da pós-graduação sobre este problema e a sua resposta dizia que o comprador dos sachês (B2B) não seria o mesmo que iria consumir este produto lá na lanchonete (B2C), e que, por conta disso, o picote não era um problema a ser resolvido.
Quando paramos para pensar que quem paga pelo sachê e oferece para os consumidores finais são os comerciantes (B2B – donos de bares, lanchonetes e restaurantes), pode realmente haver um certo conflito de interesse neste quesito.
Mudar o picote ou melhorar o corte através das gráficas é uma solução simples e fácil de colocar em prática. O problema é que, segundo donos de restaurantes, os sachês têm sido feitos propositalmente dessa forma para que seja difícil de ser aberto e consumido.
Isso mesmo. O que eles querem dizer é que quanto mais difícil de abrir, menos o produto seria consumido e, portanto, menos gasto o estabelecimento teria.
Pois bem. Esses argumentos me fizeram refletir sobre algumas coisas. 🤔
Vamos lá:
👉👉 Alguns questionamentos sobre o assunto
O primeiro questionamento é se realmente dificultar a abertura geraria economia para o estabelecimento. E a resposta é: nem sempre. Avaliando o comportamento do consumidor pude perceber que há um grande desperdício gerado por sachês mal abertos. Se a embalagem não rasga no sentido correto, o produto se espalha e vai para o lixo sem nem ser consumido. Ou seja, perde-se o primeiro produto e então temos que abrir um segundo sachê.
A melhoria dessas embalagens também resolveria uma questão sanitária. Muitos clientes acabam não conseguindo abrir o sachê apenas com as mãos e buscam o auxílio dos próprios dentes. Essa atitude pode gerar contaminação – e já foi até motivo de discussão na câmara de deputados, veja este projeto de lei.
Outro questionamento é sobre a experiência do consumidor. A satisfação do cliente é um dos pilares mais importantes para gerar a recompra de um produto. Quando pensamos em usabilidade e experiência do consumidor podemos avaliar que uma melhor interação com seu produto ou serviço gera um vínculo emocional mais forte que ajuda a gerar uma recompra. Oferecer soluções que facilitem a vida do consumidor pode se tornar um diferencial para aquele cliente voltar para o estabelecimento e consumir novamente aquele produto ou serviço.
Por isso, o simples valor adicional de um picote de sachê mais bem produzido poderia ser facilmente absorvido pelas empresas.
👉👉 Algumas soluções encontradas
Sabendo desse problema, algumas marcas começaram a melhorar suas embalagens. Isso porque, de alguma forma, esses produtos vão chegar na mão do consumidor final (B2C).
Um exemplo nesse sentido é a solução trazida pela Hellmann ‘s, da Unilever, que lançou uma opção diferenciada para os sachês de temperos (mostarda, maionese e ketchup), garantindo uma boa experiência com a marca – seja em casa ou nos estabelecimentos alimentícios. Você pode ler a matéria sobre a Hellmann ‘s neste link: “Hellmann’ s cria sachê que não é ‘impossível de abrir”.
Pesquisando sobre artigos e alternativas para facilitar a abertura dos sachês me deparei também com esta outra solução que parece ser muito interessante e que ajudaria o consumidor a abrir o produto utilizando apenas 1 das mãos, melhorando ainda mais a acessibilidade dessas embalagens.
Ele se chama Easysnap, que se fosse fazer uma tradução, seria fácil abertura. E esse nome é quase um descritivo, porque a proposta é essa mesmo, conseguir abrir a embalagem de um jeito bem fácil. Encontrei este artigo do Ricardo Shimosakai que explica seu uso e sua versatilidade.
Por fim, deixo este questionamento no ar:
Levando em consideração o branding e experiência do consumidor com a marca, é realmente mais vantajoso para donos de bares, restaurantes e lanchonetes manterem os sachês assim ou tudo não passa de uma falsa sensação de economia para evitar desperdício?
Indicações de pesquisa e leitura:
▶️ Vídeo – Campanha Hellmann’s disponível no Youtube :: https://youtu.be/zOX7XophXko
🌐Fornecedor – The One hand Technology :: https://www.easysnap.com/
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Aqui é a Priscylla, Designer apaixonada por marcas e embalagens. Sou graduada pela UTFPR – Universidade Federal Tecnológica do Paraná e especialista em Desenvolvimento de Embalagem através do MBA da FACAMP. Enquanto dirijo o meu próprio estúdio de design, também co-administro o Curso de Design de Embalagem, Rotulando®, por onde ensino e palestro sobre embalagem diariamente.
Além disso, sou co-autora do livro Rotubook, um guia de design de embalagem que está nas livrarias de todo o Brasil.